Doente

fulano

comeu ciclano

adoeceu

ciclano

comeu beltrano

adoeceu

eu

não comi ninguém

adoeci

Orbital

acreditarei no hoje

pois o amanhã está bem anormal

me dói ao pensar nisso

e eu prefiro não ter decepção

prefiro sorte

amor

cigarros

e um pedaço de papel

dedos para tocar

braços para afagar

boca para beijar

e coração para ser pedra

a pedra que o teu polimento se torna necessário

e então, me entrego ao amanhã

agora sim: eu posso

Nostálgico

logo ao sair

respirei mais fundo

lembrando de coisas

todas partes do meu mundo

infeliz foi aquele

que nunca viajou

nunca pecou

ou nunca errou

feliz daquele que tem lembranças

que tem amigos

que tem o seu cerébro

e o usa

saudade de ter lembranças

Crônica de um poeta que cansa, logo desabafa

Vou começar o desabafo, pode ser?

Então... ser gay cansa. E demais. É ter que dizer as tuas posições sexuais, o gosto do lábio do outro, se dói, se isso, se aquilo. É o uso do condicional em perguntas o tempo todo, é a ideia de opção, orientação e tantas outras, e assim por diante... Ser gay parece como nos filmes do Almodóvar, onde tudo é impossível e pior: ser gay é ter um pouco mais de inteligência, é ter que se esconder um pouco mais, é ter um pouco mais de rapidez, fragilidade e muito, mas muito menos liberdade. Ser gay é tão ruim que me faz pensar em desistir de ser assim. Aí, vem um coração palpitante, pedindo carinho, pedindo atenção e pedindo o meu coração (e que ele palpite).

É... ser gay é chato e difícil, mas se eu não fosse gay, eu não teria encontrado amigos como o Fabrício, lésbicas como a Ju, gays cantores como Ney Matogrosso e também nunca teria feito meu peito arder de saudade como arde agora pelo meu namorido.

Pois é... afinal, ser gay é não poder postar isso, é não poder gritar por amor ou respeito. Ser gay é ver risadas? Não. Ser gay é ver piada? Não.

Piada é fazer a piada!

Liberdade

eu queria saber como é estar verdadeiramente livre

eu queria entender as pessoas sem precisar fugir delas

eu gostaria de ver a lua de perto e não precisar chorar

eu entenderia minha mãe se ela estivesse por perto

eu vivo uma vida de mentira

mas tem sido tão gostoso não enfrentar medos

eu vivo a vida de forma dramática

para ter um pouco mais de graça

eu queria dividir todo o amor que tenho no coração

para que o mundo fosse um pouco menos doente

e que pudesse respirar o ar puro

eu queria dividir os amigos que tenho

para ter certeza de que

maldade não há

Nina

eu devia ter nascido antes

para poder me render todos os dias,

ser escravo

e amar Nina Simone completamente

Prólogo

até quando ser feliz será tabu?

até quando amor será sinônimo de dor?

até quando ter filhos haverá de ser plano familiar?

e me diga, o que é família?

em que ponto está errado dois homens se beijarem?

em que parte tem erro estar pelado, se isso faz parte da natureza?

em que fase da vida comer carne será menos regra e mais maldade?

é, eu não aprendi nada disso ainda..

.

O que eu tenho?

eu tenho dez dedos

tenho roupas e mãos

tenho mochilas e dores nas costas

e nem tenho uma cama

eu tive um amor

agora tenho dois

perdi meu tempo

e também minha juventude

o que fazer?

o que eu tenho?

eu digo o que eu tenho

e que nunca ninguém pode tirar de mim

um bom amigo

um bom jeito de lidar com as situações

uma ótima forma de cantar e ser feliz

e um bom vinho barato pra me entorpecer

uma vida inteira para perder mais tempo

um milhão de livros para ler

uma jornada de trabalho que cansa, mas é linda

e um bando de homofóbicos para fazer rir

Patinete

e quando não havia mais som

criei a dor

para recriar facilmente o meu sentir

sentir, esse, que dói

dói por não saber onde está

dói por encontrar algo, logo não decifrando

queria estar entre tuas pernas

gemendo o que tenho vontade de gemer

gritar para o mundo a falta que tu fazes

mas acabou

não tenho tempo

meu tempo é precioso

eu preciso de vida

tu não sabes o que isso significa

afinal, só vive quem tem bomba de sangue